Na minha festa em branco e preto de A descoberta do segundo sexo, recebi acenos de Charles Bukowski, dos beatniks de ontem e sempre, de Sigmund Freud, de Cazuza, de Francis Bacon, de Bosch e seu Jardim das Delícias, de André Breton segurando um exemplar de Nadja ao lado de Man Ray, de Nietzsche e seu Crucificado, o filho do Deus morto. Numa atitude supostamente esperta de minha parte, deixei cada um deles falando sozinho e segui apenas com os dois autores deste volume. O único convidado que conseguiu cativar minha atenção e se fazer presente por algum tempo foi Roberto Piva, certamente pelo parentesco imediato que pode ser estabelecido entre este livro e Paranoia, obra igualmente dupla que reúne as poesias de Piva e as fotografias de Wesley Duque Lee. Se em Paranoia ouvimos o canto alucinado do poeta cruzando a metrópole paulistana, aqui temos a saliva, a língua e a voz de dois forasteiros na cidade do Rio de Janeiro (a capital dos sonhos amargos?) e suas pretensões em fazer valer a crença de que o gozo sempre vai rir na cara da morte.
Fabricio Felice é pesquisador de cinema, com graduação pela Universidade Federal Fluminense e mestrado pela Universidade Federal de São Carlos.